Aos 12 anos via a cômoda mais alta de 1,60 rente à minha testa. Tudo parecia ter dimensões maiores na minha vida, pela casa por onde eu andava. Aos 15 anos eu comecei a olhar pra minha mãe olho no olho, era estranho, principalmente quando ela corria atrás de mim com um cinto na mão. Naquela época se corrigia a cintadas, agradeço por isso. Já aos 16 anos, como num passe de mágica, eu já andava de ônibus com os punhos transpassados na barra do teto, ficava praticamente pendurado sem precisar segurar na barra. Via as pessoas por cima. E estranhamente começaram as piadas, já que naquela época não existia bullying, aliás, não existia nada das tantas frescuras que têm hoje em dia, em que chamar um afrodescendente de "aê neguim" era tranquilo, e eles sempre respondiam sem a menor maldade. Também chamavam a gente de "fala coalhada", era um tempo interessante. Com 17 anos comecei a gostar de apreciar meninas altas, meu coração disparava quando passava na contramão na mesma calçada, porque não era comum ter um rosto na mesma altura do meu, quando nossos olhares podiam se entrelaçar num pequeno período de tempo e logo se soltar no espaço vazio da rua, sobre as cabeças dos reles mortais baixinhos. Não tinha a malícia de virar para trás e fixar o olhar na bunda, mas olhava para ver as madeixas e o andado, quase não acreditando que havia acabado de passar por uma alta num planeta de baixinhos. A vida seguia, sabe-se lá quando ia cruzar olhar com outros olhos na mesma altura dos meus?! O mundo ficava cinza de novo. Aos 20 anos decidi namorar alguma beldade alta e saí em busca da garota dos meus sonhos, e altura fazia parte essencial do plano. Mas nem tudo são flores e descobri da maneira mais chata que as meninas altas gostavam dos caras sarados e geralmente mais baixos que elas. Tomei mais fora do que conseguia imaginar que tomaria, todas me avaliavam pela aparência, sendo que tinha um coração pulsante com lavas de sangue aquecido bombeando todo meu corpo com tesão, paixão e muita dedicação. Não consegui nada, todas as altas queriam os baixinhos, os medianos e gordinhos, ou os mais velhos e bombados. Desiludi. Não entendia a matemática desse tipo de sentimento. Isso me trouxe frustrações incorrigíveis, insegurança que se refletiriam dez, quinze anos depois. Aos 21 anos, eu com meus 1,93m de altura conheci uma loirinha linda, uma delícia de menina com seus 1,51m de altura e 16 aninhos. Não era o que eu queria, mas foi quem viu em mim a qualidade do homem que as altas não viam. Tudo era difícil para a gente, tanto para conversar, como para abraçar, beijar, dançar. E como não transávamos - é, eu era virgem ainda, só fui perder a virgindade aos 25 anos. Tive uma vida muito reclusa, viver em São Paulo era tenso naquele tempo e não tinha acesso a assuntos sexuais com meu pai. O único assunto que tínhamos era mostrar o boletim e bater em retirada para não apanhar de cinto. Não tinha esse conceito sobre criança hiperativa e tudo era como tinha que ser, mesmo que com a cinta comendo no couro. Minha mãe punha jiló no arroz, jurubeba, pimentão e sei lá mais o quê, com suco de beterraba, couve, tomate, cenoura e limão com açúcar, e eu sequer reclamava, achava tudo lindo e delicioso (ainda acho). Coca-Cola? Fui conhecer isso aos 21 anos, influenciado pela loirinha, claro. Então namorava essa menina, até ser trocado por um cara super sarado promoter de uma boate em Taguatinga chamada London London. E o cara era mediano. Foi sofrido, mas toquei a vida com outras baixinhas. Esse bombado, como acontece com a maioria, no futuro ficam gordos ou inchados, carecas e bem feios, sem falar que ainda conseguem ficar toscos, insensíveis com suas companheiras, que geralmente continuam belas. A vida de conquistas à mulher alta nunca foi fácil, aliás, sempre foi impossível e já nem tentava mais nada, quando via uma garota alta, magra e bonita no mesmo ambiente que eu estava, entretanto meus olhos se arregalavam e meu coração acelerava sempre que cruzava o caminho de uma garota alta na mesma calçada. Acabei me casando um dia, e me casei com uma belíssima alta, loira do tipo alemã, de olhos azuis e super sarada. Foi um orgulho que senti por menos de dois anos até ela passar num concurso e dizer na letra que não precisava mais de mim. É. Definitivamente o problema estava claro, eu não servia para me relacionar com mulher alta. Mas foi uma das mais gratificantes sensações que senti com ela, por quem, ainda assim, sou eternamente grato. Quando chegávamos num restaurante não tinha quem não levantasse a cabeça para nos olhar entrando, ela com sua beleza e altura, eu com minha altura e só, certamente..lol. Nunca me esquentei com isso. Preferia que ela fosse a parte bonita da relação. Claro, apreciar o belo me tornava especial. Dançava com o rosto colado no rosto dela ao som do batimento da máquina de lavar, momento que conversávamos e namorávamos falando ao pé do ouvido. Na missa ou nos shows era confortável colar o rosto e aquecer a face assistindo o que quer que fosse à distância e ríamos quando olhávamos baixinhos se equilibrando sobre os tamburetes de pvc. Mas perdi para o governo uma bela e alta mulher, faz parte. Depois disso nunca mais tentei me relacionar. Já com 40 anos, quem se candidataria se permitir para um resto de guerra assim?! Então conheci uma Barbie em pessoa do Paraná, de Maringá, ela se apaixonou de tal maneira que demorei aceitar que era comigo. Alta, linda, uma boneca de fato, com seus 20 anos. Partiu Paraná, e lá fui eu encarar estradas perigosíssimas e 20 horas dirigindo. Fiz mais de 15 viagens de ida e volta dirigindo, e 4 de avião. Nas viagens de carro tive alguns sustos, mas Deus é Pai e enviou seu melhor Anjo da Guarda para me proteger. Tudo em nome de um novo amor, que foi em vão, quando resolvi ir de surpresa ao encontro da amada deparei-me depois de 2 mil quilômetros dirigindo ansioso e cheio de saudade, com a amada aos beijos com um baixinho bombado... Nem atrapalhei o casal, fiz meia volta e fui embora, mais 2 mil quilômetros em silêncio. Acredito que poderia ser um cara sarado se quisesse, mas acho que fiquei ofendido com essa coisa de precisar ser uma capa bonita, quando a beleza da capa fica mais bonita numa mulher do que num homem. Desde então só baixinhas, amorosas, deliciosas, carinhosas, envolventes, compreensivas, por que as altas não eram assim? Nunca entendi. Parecia que as altas tinham também o orgulho lá em cima, as exigências também, os pré-requisitos no alto, tudo tinha que ser no mesmo patamar, já as baixinhas acolhem e nos faz grandes. Sou grato pelas baixinhas todas, que muito embora não seja tão belo como gostaria, sempre tive a sorte de me envolver com as mais belas beldades abaixo de 1,65m. Mesmo sendo encantador, minha reação íntima me esquivava das cobranças de "me assuma", "deixa eu morar com você", "vem morar comigo" e tal. Penso que não podemos deixar morrer aquilo que pulsa forte dentro da mente, da alma. A vida que eu tenho é só essa, então eu preciso e mereço um amor nas alturas que dê certo, sem que eu me preocupe em perder, apenas sinta o prazer de ser amado, com concurso público ou loteria ganha. Até isso acontecer eu sei que os anos se passarão, não terei pressa nenhuma. Até lá vou comprar uma bike e ter um relacionamento sério com essa magrela.