Fé Midiconsumista
Vivemos tempos de cansaço da Fé tradicional, invadidos pelas crenças universais, pelos filmes com imagens incríveis e surreais em que aponta-se para a visualização a olho nu (ou com óculos 3D) de um mundo imaginário fantástico de fadas, duendes, dragões, magias, espíritos e toda fantasia antes impossível de ver, só de imaginar. Não estamos na era de Peixes nem de Aquário, mas na era do imaginário coletivo, em que a fé se respalda nas maravilhas criadas pelo próprio homem, confundindo a mente de cristãos pelo mundo todo, arrebanhando milhares de pessoas à um conceito de fé estupendo, incrível e emocionante pelos efeitos especiais que eles causam. As pessoas estão em busca de emoções fortes, querem o ápice do sentimento. Os brinquedos em parques de diversões estão cada vez mais insanos, os tobogãs de parques aquáticos estão sendo construídos com alturas e declives cada vez mais impossíveis de descer escorregando, piscinas são projetadas para fora dos limites do edifício, pontes de vidro sobre abismos, pisos transparentes em aviões e embarcações. Os esportes radicais em que se salta com corda amarrada nos tornozelos precipício abaixo, gaiolas mergulhadas em meio a tubarões gigantes violentos, o ser humano está fascinado com a ideia de ter fé além dos seus limites mortais. Se fala em ressuscitar os dinossauros, os animais extintos, a própria vida humana. A fé pelo oculto, pela física quântica, pela liberdade de se lançar ao desconhecido, tudo é possível, tudo é aceito, vale tudo. Doutrinas de fé estão sendo questionadas por seus seguidores, que pensam que elas servem para escravizar, quando na verdade são indicadores de uma vida plena e duradoura durante a vida e depois dela. A fé banalizada pela mídia, devorada pelos midiconsumistas, pessoas que adoram a beleza e o encantamento dos comerciais de tevê, e correm para os mercados em busca da melhor oferta que represente a fé que possuem. Na Páscoa, ovos de chocolate e coelhinho felpudo branco, talvez uma pomba em forma de panetone, a colomba pascal. Para que pensar no sangue de um santo escorrendo através de um cravo de ferro enferrujado, todo estrupiado numa cruz, se mais bonito é pensar onde o coelhinho escondeu os ovos de chocolate?! Para que pensar no nascimento de um menino-Deus, sendo essa criança o pai, o filho e o espírito santo em um só, quando é melhor pensar no bom e gordo velhinho de barba branca, vestido de vermelho, transportado por renas voadoras, num trenó cheio de presentes, mesmo que nunca se tenha usado trenós num país tão quente como o Brasil?! Os midiconsumistas precisam ter fé nos comerciais de televisão, precisam garantir as compras, os produtos, o chester, o bacalhau, o peru assado. Precisam dar presentes, enviar cartões de felicitações, e-mails, messengers, compartilhar amor em imagens pelo whatsapp, para logo depois dessas festividades midiconsumistas ninguém ter a coragem de pegar o telefone e ligar para cada uma dessas pessoas felicitadas e bater um bom e agradável papo, tampouco visitá-las, tampouco perdoá-las, menos ainda pedir perdão, exatamente como estava no cartão, na imagem, na mensagem. Vivemos em tempos de "façam o que eu digo, não façam o que eu faço" se quiserem que tais mensagens, presentes e lembranças cheguem nas próximas datas festivas. Ontem foi comemorado o dia do beijo, coincidentemente foi ontem também o dia em que Judas traiu a Cristo com seu beijo na face. Algum palpite? Nem precisa né?! Então tá, sigamos nossa crença nas filas dos hipermercados, nas lojas e na hipocrisia de nossa doutrina de fé.